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Tiffany & Co: as criações de Elsa Peretti completam cinco décadas
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Inspirada pela natureza e pelo corpo humano, as criações de Elsa Peretti para a Tiffany & Co. completam cinco décadas e estão ainda mais modernas e desejáveis. Para comemorar, chegam os anéis Bone e Split e safras especiais de joias icônicas. Confira!
Se você assistiu ao documentário sobre o estilista Halston, deve ter se encantado por Elsa Peretti, interpretada pela atriz Rebecca Dayan. Se não assistiu, já deve ter visto a icônica foto dela vestida de coelhinha da Playboy clicada por Helmut Newton ou ouviu falar da designer que assina algumas das peças mais desejadas da Tiffany & Co. Fato é que Elsa é daquelas personagens irresistíveis, tanto pelo talento quanto pela trajetória. Nascida em Florença, na Itália, estudou design de interiores, foi modelo e se encontrou na joalheria.
Tão importante quanto Nova York como cenário dessa história é a região da Catalunha, na Espanha. Foi em 1968 que Elsa descobriu, por meio de uma fotografia de sua amiga Colita, Sant Martí Vell, uma vila localizada na província de Girona, região que já estava em seu radar pela beleza mediterrânea da Costa Brava, por seus redutos de pescadores que atraíram escritores, fotógrafos e artistas como Salvador Dalí. Mesmo castigada pelo tempo – os imóveis não tinham nem telhados –, Elsa comprou a Casa Pequeña, um prédio amarelo-mostarda com vista para a praça da cidade. “Não havia eletricidade, e o lugar estava tão deserto que tomei banho na praça com um balde de água aquecida na lareira. Morcegos voavam em bandos em ruas vazias”, contou, certa vez, em uma entrevista. O encanto foi tão grande que aos poucos ela foi adquirindo e restaurando outros imóveis do lugar, mantendo a arquitetura original o máximo possível – ela também apoiou a reforma do interior da igreja do século 16.
O centro da vida pessoal e profissional de Elsa Peretti era em Manhattan nessa época, mas as viagens a Barcelona eram frequentes. Foi onde se juntou ao “la gauche divine” (a esquerda divina), um movimento liberal de intelectuais e artistas nascido em resposta ao regime de Franco e onde também começou a tirar do papel suas primeiras joias com a ajuda do escultor catalão Xavier Corberó e do ourives Vincent Abad. Algumas de suas primeiras criações foram um pingente em uma longa tira de couro, inspirado em um vaso de flores que ela havia encontrado em uma feira de antiguidades e que finalizou looks no desfile de Giorgio di Sant’Angelo, um cinto com maxifivela inspirado em sela de cavalo que entrou na coleção de Halston e o bracelete Bone, inspirado em um osso humano encontrado em uma igreja capuchinha do século 17.
Quando Halston apresentou Elsa a Henry Platt, neto do fundador e então presidente da Tiffany & Co., em 1974, a conexão foi imediata, talvez por sua visão original. Em uma época em que a prata não era considerada um metal nobre e joia era algo que o homem costumava usar para conquistar uma mulher, Elsa queria criar peças com preços mais acessíveis, para serem adquiridas pelas próprias mulheres e usadas todos os dias, acompanhando um look casual ou de festa. A parceria deu tão certo que revolucionou para sempre o design de joias e objetos, levando a algumas das peças mais reverenciadas e colecionáveis do setor nestes 50 anos.
Para comemorar a data, a joalheria uniu vários pontos dessa história. Começando pelo lançamento do último projeto da designer, os anéis Bone e Split, inspirados na lendária pulseira de punho, que agora também ganha versão de ouro amarelo com uma gota de pavê de diamantes. E está reeditando até o próximo ano outras de suas peças icônicas com pedras preciosas e em escalas ousadas. Seus célebres designs Open Heart, Starfish, Bean, Scorpion e Amapola chegam incrementados com diamantes, juntamente com brincos Snake e High Tide em comprimentos dramáticos, além de colares e brincos statement Diamonds by the Yard. Outra ação comemorativa é a reedição de Fifteen of my Fifty with Tiffany, um compilado de referências concebido originalmente como marco dos 15 anos de colaboração com a joalheria americana.
O cenário escolhido para a celebração que acompanhamos de perto foi Sant Martí Vell – refúgio vital e criativo de Elsa Peretti entre os anos 1980 até seu falecimento, em 2021, aos 80 anos; já em 2000, foi transformada pela própria designer na Fundação Nando e Elsa Peretti, em homenagem ao seu pai, Ferdinando. Com decoração intacta, o lugar abriga a coleção pessoal de Elsa, com suas muitas peças de artesanato indígena, joias art déco e objetos de arte adquiridos durante viagens ao Oriente, à Oceania e à África, além de seus designs para a Tiffany & Co. A fundação, composta de 18 casas e três masias, ou casas de campo, também se dedica a projetos ambientais, sociais e educacionais em vários países. A seguir, Stefano Palumbo, presidente da instituição, reflete sobre o legado de Elsa Peretti.
Por que as criações de Elsa para a Tiffany & Co. ainda são tão relevantes?
Como Elsa costumava dizer, joias não são moda e não precisam ser descartadas assim que surge algo novo. Ela tinha um processo particularmente lento na confecção das suas joias, composto de mil detalhes. E usava seus protótipos durante anos antes de colocá-los em produção porque queria ter certeza de que as joias seriam confortáveis e que o resultado seria impecável. Esse foi o segredo do seu sucesso, um sucesso que não teme comparações e nunca sairá de moda.
Quem era a mulher que Elsa quis representar nas suas criações?
Elsa Peretti foi uma mulher emancipada que lutou durante toda a sua vida pela sua independência e liberdade e para dar expressão à sua criatividade. Em Barcelona, na década de 1970, e graças à amizade com a fotógrafa Colita, conheceu o movimento feminista que, durante a transição política espanhola, clamava pela igualdade de direitos para as mulheres. Por meio da sua fundação, apoiou numerosos projetos para incentivar o debate, a informação e a defesa da dignidade e da igualdade das mulheres em todo o mundo. Essa é a mulher que Elsa queria representar nas suas criações.
Como o talento de Elsa para joias se relaciona com o trabalho realizado na fundação?
Elsa era uma força da natureza e uma força para a natureza. As ideias para suas criações surgiram principalmente quando ela estava sentada ao ar livre e relaxada. “A maioria dos meus designs é inspirada na natureza, como feijões, estrelas e lágrimas, bem como escorpiões e cobras”, ela falava. Um feijão-de-lima [ feijão-fava] foi transformado em um brilhante isqueiro de prata que se podia carregar no bolso, um osso humano tornou-se um castiçal escultural, uma corrente que ela encontrou no Mar Egeu foi transformada em um colar fluido de prata e ouro, o encantador movimento dos escorpiões e das cobras que ela admirava em Sant Martí Vell inspirou designs célebres para a Tiffany & Co. A mesma dedicação e o mesmo carinho que Elsa tinha pelo mundo natural a levaram a realizar seu maior sonho em 2000, quando criou uma fundação em homenagem ao seu pai, Nando, cujo sentido de compromisso, integridade e generosidade a inf luenciou profundamente como mulher e filantropa. À frente do seu tempo, sempre teve um pensamento espontâneo e ecológico, posteriormente apurado e aprofundado por leituras, documentários e estudos dos naturalistas Felix Rodriguez de la Fuente e Jane Goodall e por suas muitas viagens e encontros com diversas tradições culturais e povos indígenas. Como filantropa, sempre defendeu a proteção do meio ambiente e dos direitos humanos.
O Bone Cuff e o Split Cuff sãosímbolos de poder e glamour?
Poder e glamour são dois conceitos muito interessantes para definir uma peça de joalheria, que ao longo dos anos se tornou símbolo de emancipação para as mulheres. É verdade que muitas falaram a Elsa que usar um Bone Cuff as fazia se sentirem mais seguras, fortes e confiantes em si mesmas. Certamente Elsa usou seu Bone Cuff de prata todos os dias de sua vida, e não se pode dizer que lhe faltasse poder e glamour.
Como Elsa chegou à decisão de ter versões direita e esquerda do bracelete Bone?
A ideia sempre foi deixar a joia confortável. E o desafio era tornar o metal tão sinuoso que fizesse parte do corpo da mulher, acompanhando suas formas e não as contrastando. A decisão de fazer dois modelos, um para o pulso direito e outro para o pulso esquerdo, decorre da praticidade de Elsa, que via as joias como objetos para usar no dia a dia, acompanhando um jeans ou um vestido de noite.
É possível imaginar Elsa Peretti sem a Tiffany & Co. e vice-versa?
Se falarmos de Elsa como designer de joias, esse casamento pode ser considerado bem-sucedido e feliz. Mas existem muitas Elsas, e seria redutor ver Elsa Peretti hoje apenas como designer de joias. Certamente, a Tiffany em 1974 teve uma intuição visionária ao apostar em uma artista tão diversa e polêmica. Uma gratidão que Elsa devolveu em grande parte à marca com décadas de trabalho árduo e disciplina. Quando Halston apresentou Elsa a Henry Platt, em 1974, não foi tarefa fácil convencer uma marca como a Tiffany a investir em um design tão moderno, em uma época em que a prata não era considerada um metal nobre e as joias eram algo que os homens costumavam usar para conquistar as mulheres. Elsa fez a prata se tornar desejável, democratizou os diamantes ao deixá-los economicamente acessíveis às mulheres trabalhadoras, tornou confortável o uso de uma joia ao convertê-la em algo suave, sensual e feminino ao máximo.
Na sua opinião, qual é o legado de Elsa?
Décadas depois da estreia da sua primeira coleção de joias, em setembro de 1974, o seu nome continua a ser sinônimo de ousadia e versatilidade não só em joias, mas também em objetos e interiores. Por essa razão, ela é considerada uma verdadeira pioneira na história do design, e seu trabalho continua sendo um farol para uma nova geração de artistas e designers. Como afirmou o ex-CEO da Tiffany & Co. Mike Kowalski: “Elsa trouxe uma nova intensidade, um novo compromisso, uma nova paixão ao nosso foco de design”. Sua abordagem do design reflete sua filosofia geral de vida. Ela viveu com generosidade e empatia, e isso se revela na sua arte e no seu compromisso com um amplo espectro de iniciativas humanitárias, culturais, científicas, educacionais e de direitos humanos.
Em quais partes ou detalhes na fundação você percebe a personalidade de Elsa?
Na Madonna na igreja. Você pode imaginar alguém desenhando apenas uma linha, e com essa linha você vê uma mulher, a maternidade, a santidade, o catolicismo, a liberdade de uma mulher? Você vê tudo o que pertence ao passado de Elsa e ao seu conceito sobre um ser humano e uma mulher. É extremamente impactante para mim que ela tenha colocado essa obra na igreja e não na sua casa. As raízes católicas permaneceram. A infância de um artista é sempre muito importante.
Silvana Holzmeister
November 07, 2024